sábado, 17 de março de 2012

A beleza do tempo

Era uma sexta-feira. Ou um sábado. Ou uma quarta. Mas não importava, não aqui. Vim para cá justamente para isso, fugir das correntes do tempo. Aqui ele simplesmente não importava. Vou vivendo, um dia após o outro, passe tempo ou não. Assim que descobri que a vida é curta demais para desperdiçá-la, fugi da cidade. Aqui a única fila que existe é a do gado voltando do pasto, guiado pelo cavaleiro em seu cavalo, com o pôr do sol como paisagem.
 Eu tinha acabado de trazer o gado do pasto, e o Sol estava maravilhoso. Por mais que eu tente, é impossível explicar. Desde onde o céu encontrava a terra até acima de minha cabeça, o céu estava laranja, vermelho e azul. As nuvens passavam, tentando diminuir a velocidade para apreciar aquela perfeita obra de arte. Eu ainda precisava ir à vila comprar velas, pois as minhas haviam acabado, e não é nada bom ficar no escuro. Eu gosto de ler antes de dormir, e fico acordado até tarde, o máximo que eu conseguir, o que deve ser por volta das oito da noite, mas como eu disse, aqui, isso não importa. Decidi deixar as velas para depois.
 Sentei-me ao pé de uma árvore e fiquei olhando a coisa mais bonita que eu já havia visto. Era exatamente por esses momentos que eu havia me mudado. Estava cansado de acordar e não ver o Sol nascer por ter de correr até o trabalho, de depois do almoço não poder parar e sentar ao pé de um poste (árvores boas são difíceis de achar em São Paulo) e aproveitar aquela sombra para descansar e ver as nuvens passarem, ou de não ver as estrelas por causa da poluição. Nesse momento, sentado, a vida fazia sentido, e meus olhos abriam-se cada vez mais, querendo gravar aquele momento para sempre na memória. Sinto até um pouco de dó das pessoas que passam a vida tentando explicá-la, pois nem que vivessem mil anos o seriam capazes de fazer. Certas coisas não se explicam, se sentem, e a vida é só mais uma delas.
 Meu olho agora ardia, e o Sol já estava quase se escondendo atrás de um monte. Fiquei pensando em como é que pode nossos olhos arderem diante de algo tão belo.
 Levantei, e fui, sem pressa, à vila para comprar as velas. Quando cheguei na vendinha, já estava escuro, e o Seu Raimundo estava fechando, mas com o bom humor de sempre me atendeu e batemos papo. Aqui as pessoas não têm pressa. Mesmo assim, despedi-me dele e tomei o caminho de volta. Acendi uma vela para não pisar em buracos. Gostava da chama e das sombras, que hipnotizavam com sua dança. Ao meu lado, passou uma moça, e quando a luz da vela iluminou seu rosto, meus olhos arderam e o tempo começou a importar. Meus olhos arderam muito mais do que haviam ardido quando olhei para o Sol, e implorei ao tempo para que ele parasse naquele instante, mas não parou, talvez ressentido pelo fato de eu não ligar para ele.
 Não importa o que os estudiosos dizem, mas nossos olhos não ardem por causa da luz ou por qualquer outro motivo, e sim por causa da beleza.
 Vocês não sabem nada. Mas acho que isso vocês já sabem.

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